quarta-feira, novembro 28, 2007

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"É comum pensar-se que os conservadores mais encontradiços são os velhos e os inovadores são os novos. Não é verdade. Os conservadores mais vulgares são os novos. Os novos que querem viver mas não pensam nem tempo têm para pensar na maneira como se há-de viver; e daí tomam por modelo o que encontraram e já cá estava."

Tolstoi, O Diabo.

segunda-feira, novembro 26, 2007

adventures in paradise


I believe any dream that I want to
That aint the only way of keeping hope alive
And if by chance I give birth to my visions
Life is so fantastic it will come as no surprise
Cause everyday is adventures in paradise
Woven well through the fabrics of time

I believe I am free, let it free me
That aint the only way of getting past the jive
And every day something magical passes
Sunshine on my body, rainbows bloomin in the sky
Cause everyday is adventures in paradise
It is real if its only in your mind
In your mind

It is real if its only in your mind
In your mind
Step this way for another adventure in paradise

segunda-feira, novembro 19, 2007

filhos

Acabo de ver que chegou ao mercado nacional um telefone para crianças de 5/6 anos. Está um gajo a falar na televisão a dar uma série de razões para a utilidade de tal aparelho. Penso que vou ter imensa pena dos meus filhos. Na verdade não contemplo vir a ter filhos mesmo por saber que vou ter pena deles (um egoísmo desmedido). Bem, caso os tenha, vou ter imensa pena deles. Não vai bastar os nomes estranhíssimos que lhes vou dar - feodor e leão são hipóteses - vão ser também crianças totalmente alheadas do mundo. Mas, da forma como isto vai, não tenho grandes hipóteses. Arrisco a dizer que vão ser vistos pelos amigos como uma espécie de amish. Não vão ter qualquer consola. Todo e qualquer veículo que tenham enquanto pequenos vai ser movido a pedais. É cruel demais. Acabou-se a linhagem Pai. Desculpa.

conterrânea

quarta-feira, novembro 14, 2007

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"O autocarro, o autocarro, o que terá sido que interveio no autocarro que me impediu de me vir para cima do braço da shikse adormecida - não faço ideia. Acha que terá sido o bom senso? A mais elementar decência? A minha sanidade mental, como costuma dizer-se, a vir à tona? Pois sim, mas onde estava essa sanidade na tarde em que eu cheguei da escola e a minha mãe não estava em casa, e vi no nosso frigorífico um grande naco roxo de fígado cru? Acho que já confessei a história do bocado de fígado que comprei num talho e fodi atrás de um tapume a caminho da lição de bar mitzvah. Ora bem, agora quero deixar tudo em pratos limpos, Vossa Santidade. Aquele - ela - isso - não foi o meu primeiro pedaço. O primeiro, comi-o na privacidade da minha própria casa, enrolado à volta da piça, na casa de banho, às três e meia da tarde - e depois comi-o outra vez na ponta do garfo, às cinco e meia, na companhia dos outros membros da minha pobre família inocente.
Ora aí tem. Agora já sabe a pior coisa que eu fiz na minha vida. Fodi o jantar da minha própria família."


Philip Roth em O Complexo de Portnoy.

segunda-feira, novembro 12, 2007

Plano de Evasão (2)


Esta interpretação das últimas páginas do Plano de Evasão do Bioy Casares faz-me notar que o próprio título da obra alarga o seu significado. O plano evasão passa-se também para o plano dos sentidos. Uma fuga do estabelecido para o desconhecido. Para uma interpretação sensorial mais ampla e vasta. Uma evasão. A segunda do livro.


quinta-feira, novembro 08, 2007

Plano de Evasão

Não vos queria contar a história do Plano de Evasão do Adolfo Bioy Casares. Em primeiro lugar porque não consigo. Em segundo, porque alimento a secreta esperança que vocês confiem no meu gosto literário e que leiam o livro apenas porque eu o mencionei.

Bioy Casares é um autor interessante. Em ambos os livros que li dele (A Invenção de Morel e Plano de Evasão), estive totalmente perdido na narrativa até às últimas páginas. Chegamos às últimas quinze páginas com uma série de pontas soltas que depois são magistralmente coladas ou cosidas. Unidas sem falhas. Todo e qualquer ponto é ligado a outro. É um exercício maravilhoso.

Em Plano de Evasão as últimas quinze páginas (de onde transcrevi a citação anterior) são de uma natureza altamente filosófica. Têm-me dado que pensar. Casares fala-nos da unificação dos sentidos. Descreve a nossa existência sensorial como um processo de catalogação. Na verdade, não existiriam sentidos de um tipo ou de outro. Existe apenas um enorme fluxo sensorial - uma massa - da qual nós extraímos partes que arquivamos em compartimentos diferentes. O tacto, o gosto , a visão, o olfacto e a audição seriam portanto uma criação nossa. Há a quem as cores transmitem sentimento. Há quem veja sons nas cores. Nem todos apreenderíamos tudo através do mesmo sentido. Nem todos apreendemos. Mas é interessante pensar assim. Que tudo pode ser inteligível de outra forma. Através de outro sentido. Multiplica a experiências da vida, o que é muito agradável.

terça-feira, novembro 06, 2007

omissões

Comecei hoje a ler o Roth*. Nunca tinha lido nada dele. Fui pressionado por diversas pessoas que considero minhas amigas a lê-lo. Dizem que é bom. Acontece que a estas mesmas pessoas irritava o facto de eu apenas ler autores mortos. Confirmo. Os últimos livros que li foram do Machado de Assis (vários), do Eça de Queiróz (vários), do Bioy Casares (vários), do Giorgio Bassani (vários), do Vergílio Ferreira (um). Embora estes três últimos sejam mais recentes que os dois anteriores, a verdade é que eu gosto particularmente do fim do século XIX e inicio do século XX. Gosto também do estilo de escrita de todos eles, embora seja um bocadinho diferente de autor para autor. Sempre gostei do estilo. São narrativas pausadas. Calmas. Onde acção se desenrola com um agradável vagar. Hoje, ao ler Roth, descobri mais uma coisa que me agrada nestes autores clássicos - as omissões. Ainda nem haviam passado dez páginas de Roth, já me tinha deparado com alusões, sempre desagradáveis, a odores como "cu", "cera dos ouvidos" e outras secreções corporais. Eu bem sei que estas existem. O Eça, o Machado de Assis e o Bassani também sabiam. Mas eles não diziam nada sobre elas. Eu prefiro assim na verdade. Mais um ponto para os clássicos.

* Estou a ler "O Complexo de Portnoy" do Philip Roth e prometo tentar lê-lo até ao fim.

segunda-feira, novembro 05, 2007

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"A vida e o mundo, como visão de um homem qualquer: vivemos sobre pedras e barro, entre madeiras com folhas verdes, devorando fragmentos do universo que nos inclui, entre fogueiras, entre fluidos, combinando ressonâncias, protegendo o passado e o porvir, dolorosos, térmicos, rituais, sonhando que sonhamos, irritados, cheirando, tacteando, entre pessoas, num insaciável jardim que a nossa queda abolirá.
Visão da física: uma opaca, uma interminável extensão de protões e de electrões, irradiando no vazio; ou, talvez (fantasma de universo), o conjunto de irradiações de uma matéria que não existe.
Como numa criptografia, nas diferenças dos movimentos atómicos, o homem interpreta: ali o sabor de uma gota de água do mar, ali o vento nas escuras casuarinas, ali uma aspereza no metal polido, ali a fragrância do trevo na hecatombe do Verão, aqui o teu rosto. Se houvesse uma mudança nos movimentos dos átomos, aquele lírio seria, talvez, o golpe de água que derruba a represa, ou uma manada de girafas, ou a glória do entardecer. Uma mudança no ajuste dos meus sentidos faria, talvez, das quatro paredes desta cela a sombra da macieira do primeiro pomar.
Como saber se o pássaro que cruza os ares não é um imenso mundo de voluptuosidade, vedado aos teus cinco sentidos?"

William Blake, citado em Plano de Evasão de Adolfo Bioy Casares.

sexta-feira, novembro 02, 2007

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não me apetece sair de casa. não me apetece ficar em casa. não me apetece sair de lisboa. não me apetece ficar em lisboa. não me apetece ir jantar fora. não me apetece fazer jantar. não me apetece beber. não me apetece um cigarro (embora já tenha fumado uns dez). não me apetece estar com ninguém. não me apetece falar. não me apetece escrever. não me apetece ler. nada. antigamente chamava-se a isto neura. é um nome um bocadinho pretensioso para um parvalhão como eu hoje.