Os telemóveis, e os meios de comunicação mais recentes, têm efeitos inacreditáveis nas nossas vidas.
Basta lembrar como era quando não tínhamos todos telemóvel. Quando ninguém tinha aliás. Era às 8 era às 8.
Lá se ficava sentado à espera que chegassem os nossos convivas. Podiam ser 8 e 40 que o máximo que havia a fazer era ligar para casa das pessoas.
Não tenho dados estatísticos para vos provar que as pessoas eram mais pontuais quando não tinham telemóveis do que o são hoje em dia. Suspeito no entanto que deveriam ser. Pelo menos o atraso era mais penalizado.
Bem, mas sendo português (e romeno por vezes), estar a imputar aos telemóveis o atraso característico do nosso povo parece-me injusto.
Há, no entanto, algo que os telemóveis mudaram e muito e isso foi as relações pessoais.
Hoje em dia, tanto os telemóveis como os programas de conversa pela internet (os messengers e os skypes, etc.) servem como eficazes escudos aos nossos maiores medos: o medo do ridículo, o medo da rejeição, o medo da reacção alheia.
Vejo, tanto por mim como pelos meus amigos, que a maior parte das relações que mantemos, que tentamos iniciar, que pretendemos manter, que queremos modificar, funcionam por intermédio destes meios de comunicação modernos.
Podia fazer-vos aqui um interlúdio sobre o meu saudosismo neo-românticizado das cartas escritas à mão borrifadas com perfume, mas não o farei.
Noto sim, todavia, que hoje a maior parte das pessoas se escuda nesses meios para dizer o que sente. Cada vez mais acontece que o importante para ser dito é passado para aquela mensagem posterior. Quando já estamos no conforto da solidão. Quando já não temos que olhar nos olhos. Quando já não trememos.
Depois de carregarmos no enviar, somos livres. Sentimos como que se um peso nos tivesse saído das costas. Continuamos com a angústia de receber uma resposta, mas essa angústia é mitigada pela ausência de contacto, pelo relaxar da imediatez do contacto pessoal.
É, de certa forma, paradoxal porque não nos tornamos mais cobardes sempre. É verdade que não enfrentamos os nossos medos, mas é também verdade que muitas vezes dizemos aquilo que não diríamos naquela altura talvez por não ser a altura certa. O que não é de todo satisfatório de qualquer forma.
As relações pessoais perdem-se no meio das facilidades destes meios de comunicação. Já não se declara, não diz que gosta, não se diz o que vai na alma naquele momento.
Espera-se pelo escudo. Acautelam-se os riscos. Escreve-se a caminho de casa. Escreve-se quando se chega a casa. Escrevem-se e-mails, sob o perigoso mix de álcool e distância, onde se diz tudo, sentados no conforto da nossa casa. Na nossa solidão. Onde não corremos o risco de ser rejeitados de imediato. Onde as nossas desilusões podem ficar para amanhã. Onde os medos ficam à porta.
Vivemos a nossa vida emocional em diferido.
Estamos demasiado viciados no conforto.