terça-feira, julho 01, 2008

flâneur

(o meu avô já não se lembra de mim). Cheguei e prestei visita. (a minha avó, com os olhos à altura dos dele, curvada por causa da cadeira de rodas, pede-lhe que me reconheça). Dá o programa da tarde na televisão. Coitados dos velhos que ficam em casa à tarde. Sair também não é fácil. Não há passeios para cadeiras de rodas e a calçada está cheia de buracos. E os buracos estão cheios de beatas. Porcos de merda. (jorge, quem é que está aqui? quem é ele? já não te lembras? é filho de quem?). Vou beber um café e um bronco grita para uma gaja "há-des cá vir, há-des cá vir". Pensei no acordo ortográfico; há-des dá um ar grego à coisa. (jorge, é filho da isinha. é o filipe. não se lembra diz-me ela. a voz treme-lhe por saber que provavelmente, um dia, nem dela se lembrará. ela que está fechada naquela casa há 10 anos). Três obesos pedem minis pretas e riem. A empregada fala com um deles. Tem um Maserati diz ela. É dinheiro do petróleo diz ele. (ela resigna-se. eu digo que ele está a fingir. põe os olhos na televisão. falam do ronaldo). O arco do cego é um jardim com um parque de estacionamento coberto ao lado. Filhos da puta. Puseram um parque de estacionamento coberto ali. Ao lado de um jardim. O jardim não tem nada. Há um drogado deitado a apanhar sol. (vai comer batatas fritas seu sortudo! ele gosta muito de batatas fritas. é o que ele mais gosta. dê-lhe todos os dias, digo. faz-lhe mal à saúde diz-me ela). Procuro um Remarque para esquecer. Só há a edição de bolso da Europa-América. Uma merda de edição. A página nem é centrada. A Oeste nada de novo.